quinta-feira

Portugal Complexado e o Património Histórico de Nikolaiviertel em Berlim




por João Aníbal Henriques 

Portugal vive de olhos fechados para o que fazem os outros. Incapaz de olhar à volta e complexado com a sua pretensa posição periférica no seio de uma Europa que desde sempre procura caminhar em frente, o País produz redundâncias atrás de redundâncias, assentes num conjunto de académicos provincianos e sem capacidade para entender a vida e o mundo.

Este fenómeno, visível em áreas tão díspares quanto as da saúde ou da educação, atinge o seu auge na área da arquitectura e do património. 

Com quase 900 anos de História, Portugal possui uma riqueza inigualável que, mesmo com as destruições impostas pelas revoluções que foram oferecendo oportunidades de negócio às suas clientelas destruindo as maravilhas que Portugal possuía, continua a ser de tal forma impactante que não deixa indiferente quem nos visita.

Mas quando se trata de recuperar, reconstruir ou preservar, os nossos arquitectos, urbanistas e planeadores optam por aproveitar a oportunidade para deixar a sua marca, mesmo quando isso significa produzir intervenções que nada têm a ver com a nossa história, a nossa cultura ou mesmo com o espaço envolvente. Veja-se o que aconteceu com o Centro Cultural de Belém, com a Expo98, com a Praça do Saldanha ou com o antigo edifício do Hotel Estoril-Sol…

Em oposição, nos países mais desenvolvidos e economicamente mais florescentes, o que se passa é exactamente o contrário. Na Alemanha, quase completamente arrasada por duas guerras mundiais e pelo inquietante período de domínio soviético, a opção passa por reconstruir, de uma forma que os pseudo-eruditos Portugueses teimam em adjectivar de “pastiche”, os monumentos, as casas e as ruas, criando réplicas exactas do que existiu noutros tempos.




E, explicando que ao proceder dessa forma estão a contribuir em termos pedagógicos para recondicionar e reformatar a identidade dos alemães, reforçando o seu conhecimento e entendimento relativamente ao passado e ultrapassando complexos múltiplos que resultam dos muitos acidentes pelos quais passaram, os alemães recebem anualmente milhões de turistas que enchem as cidades, produzindo riqueza para hotéis, restaurantes, comércio e para o próprio estado…

Em Berlim, por exemplo, os ataques aliados de 1945 não deixaram pedra sobre pedra. Mas hoje, recebendo por ano milhões e milhões de visitantes estrangeiros, vai reforçando o seu potencial interesse através da reconstrução dos seus monumentos mais antigos. Veja-se o caso do quarteirão “medieval” de Nikolaiviertel… da catedral… da ilha dos museus… etc.





É bonito? Sem dúvida que sim. Tem interesse? Muito. Vale a pena visitar? O número de visitantes atesta isso mesmo. Aumentam a riqueza do País e da Cidade? Claro que sim. Reforçam a identidade e a cidadania? Certamente. 

Mas em Portugal, complexados com tudo e com uma história recente escabrosa, continuamos a assistir impavidamente à destruição do nosso património e das nossas memórias, em prol de uma pseudomodernidade provinciana e retrógrada imposta à força para reforçar a marca de visibilidade de uns quantos.

Pobre país este que tanto tem sofrido ao longo deste últimos 40 anos!