segunda-feira

"Colonização Moderna, Descolonização e Dependência" de António de Sousa Lara




Acaba de ser lançado no ISCSP onde o autor é Professor Catedrático e Presidente do Conselho Científico o livro “Colonização Moderna, Descolonização e Dependência” da autoria de António de Sousa Lara. Trata da Teoria da Colonização no âmbito das Relações Internacionais de cujo departamento o autor é também o Coordenador, bem como das colonizações modernas comparadas terminando com uma parte relativa à nova temática do imperialismo e dependência no período pós-descolonização. Depois deste lançamento, o autor prepara o lançamento de outro livro, bem como o quarto volume dos estudos colectivos que coordena e no qual participa como co-autor relativos à Subversão, caos e guerra.


domingo

O Herdeiro de Antioquia de Paulo Costa Gonçalves




Cruzar a História com as histórias, recriando um enredo complexo e interessante, é um desafio nada fácil de concretizar mas que dá forma ao livro “O Herdeiro de Antioquia”, da autoria de Paulo Costa Gonçalves, lançado recentemente pela Chiado Editora.

Conjugando uma trama que perpassa quase mil anos de História, a partir da invasão da Cidade de Antioquia no ano de 1098 até à Lisboa cosmopolita de 2013, Paulo Costa Gonçalves atravessa de forma arrepiante as paixões e os sentimentos de uma família marcada por uma lendária maldição. 

Num ritmo frenético que prende quem a lê, a história enreda-se em pistas e contra-pistas, dando forma a laivos de inesperada surpresa que surgem a cada momento da acção, conjugando-se num clímax imprevisível que garante emoções fortes até à última página. Os protagonistas, centrados num humanismo que explica a força e a determinação com que lidam com os muitos percalços que os envolvem, oferecem-nos uma perspectiva diferente de uma Lisboa moderna e em que muito se passa para além daquilo que nos é dado ver. 

 Licenciado em Sociologia e Planeamento pelo ISCTE-IUL, Paulo Costa Gonçalves considera-se, para já, uma espécie de escritor que, na sua singularidade, tenta ser um contador de histórias vertiginosas e sagazes e que tenham a capacidade de surpreender os leitores. 


segunda-feira

O Milagre Alquímico de Estremoz




Existem cidades que são mais do que uma mera cidade. Estremoz, assente na brancura imaculada do seu mármore de qualidade conhecida e reconhecida internacionalmente, é um desses espaços especiais. Conjuga uma história milenar com um vastíssimo rol de histórias e lendas que, oferecendo-lhe a grandiosidade das grandes capitais, a envolvem num laivo de glamour que envolve quem tem a sorte de nela se perder.

por João Aníbal Henriques

Estremoz é uma cidade especial. Dividida em duas partes que se conjugam operando como dois pólos de atracção junto daqueles que a visitam, a cidade comporta um intrincado e emaranhado conjunto de ruelas antigas que dão forma ao seu espaço medieval, compartimentado dentro das muralhas do seu ancestral castelo, e o amplo espaço moderno, que se espraia ao longo da planície, com as suas praças bem delineadas e os monumentos que valorizam cada esquina.




Quem entra em Estremoz pela primeira vez, fica imediatamente marcado pelo impacto que resulta da sua torre medieval. Do alto da colina onde assenta o núcleo mais antigo do burgo, a torre é possivelmente o mais antigo monumento da cidade, uma vez que o palácio real, bem como todo o quarteirão envolvente, foi completamente destruído por uma misteriosa explosão acontecida durante uma noite de Inverno no Século XVII.  À sua volta, com aquele tom intimista que a cidade ainda tem, tudo o resto são reconstruções mais recentes, sendo que a grande maioria foi construída durante o reinado de Dom João V e com o apoio da Casa Real.

Apesar de aparentemente não fazer qualquer sentido, pois sendo cidade pequena quando comparada com as capitais de Évora, Portalegre e Beja que a envolvem, a monumentalidade e a grandeza de Estremoz prende-se com o carácter simbólico que subjaz da sua história muito especial.

O primeiro personagem grande da História de Estremoz, depois de uma longa ocupação humana que se pressupõe ter começado ainda na Pré-História mas que teve momentos de grande fulgor durante o período Romano e, mais tarde, sob domínio Muçulmano, é Geraldo o Sem Pavor, herói mítico do Alentejo que, sob ordens de Dom Afonso Henriques, terá reconquistado para a Cristandade grande parte das cidades do Sul de Portugal. Sabe-se que Geraldo conquistou Estremoz em 1185 e que, mercê do período conturbado que então se vivia, ela foi perdida e reconquistada muitas vezes até ter entrado em definitivo na posse dos Reis de Portugal. Em 1258, pela mão de Dom Afonso III, recebeu o seu primeiro foral, facto que sustenta e comprova a importância que tinha no contexto da consolidação política nacional.

De entre outros, foi Dom Dinis um dos principais impulsionadores dessa importância relativamente à cidade. Foi ele quem, possivelmente por gosto pessoal relativamente ao espaço e à paisagem, mandou edificar o Paço Real e a torre de menagem atrás mencionada, que passaram a funcionar como baluarte da defensão do reino nas paragens longínquas do Alentejo.




O seu topónimo – Estremoz – é, aliás, um repositório importante dessa situação extrema em que se encontra a cidade, localizada numa zona de fronteira e sempre sujeita às vicissitudes e às pressões que dela derivavam.

A Rainha Santa Isabel, ligada de forma indelével e permanente aos destinos de Estremoz, onde aliás morreu em 1336, vê reforçados os seus laços com a urbe como consequência desse facto. A sua santidade, mais do que ao milagre das rosas, que lhe dá fama, fica a dever-se ao trabalho que efectivamente fez pela paz no reino de Portugal e que, por vicissitudes diversas, a traz amiúde até estas paragens.

Filha do Rei de Aragão e de uma princesa Italiana, Isabel casou com Dom Dinis e sofreu em vida as amarguras de um casamento do qual parece que resultou pouca afeição. O rei, conhecido admirador do belo sexo, dedicava-se pouco à sua santa esposa e procurava amiúde o folguedo junto das damas da região. Conhecida pela sua bonomia, a rainha terá sido conivente com tal situação, recebendo no paço, onde lhes facultava condições de vida e uma educação semelhante à que dava aos seus filhos naturais, os vários bastardos reais.




O futuro Dom Afonso IV, seu filho primogénito e legítimo herdeiro do trono, foi ele próprio alvo dessa situação, dado que o seu pai, tendo preferência por um dos seus filhos bastardos, teimou em deixar-lhe por herança o reino de Portugal. O príncipe, defendendo os seus direitos, terá dado início à primeira guerra civil da nossa história, que teria sido muito mais sangrenta se não fosse a intervenção permanente da sua mãe a Rainha Santa Isabel.

Em 1336, a antiga rainha que havia professado em Santa Clara-a-Velha, em Coimbra, onde desejava passar os seus últimos dias ajudando os pobres, vê-se obrigada a nova e derradeira viagem a Estremoz para evitar uma nova guerra do seu filho agora já rei com o seu cunhado Rei de Castela. Deixando Coimbra carregada de peste, a rainha sucumbe em Estremoz, não sem antes evitar novo derramamento de sangue e de ter deixado expressa a sua vontade de ser sepultada em Coimbra conforme havia planeado fazer.

O cortejo fúnebre, que se alongou durante vários dias sob o calor tórrido do Julho no Alentejo, transportou os restos mortais da rainha de Estremoz até Coimbra. O caixão, levado em ombros pelas principais personagens do reino, acabou por rebentar durante o percurso, deixando sair um líquido viscoso que se ia espalhando ao longo do trajecto. Mas, para surpresa e gáudio dos que tiveram a sorte de participar neste triste evento, o líquido que saia deixava no ar um forte aroma a flores que reforçou a aura de santidade que já se atribuía à rainha. Não se sabendo com exactidão quanto haverá de lenda e de realidade nesta história, o certo é que, muitos séculos depois, quando o caixão voltou a ser aberto quando se procedeu à transladação do corpo de Santa Clara-a-Velha para Santa Clara-a-Nova, se encontrou incorrupto o corpo da rainha, sendo que ainda hoje, quase setecentos anos depois da sua morte, se expõe a sua mão à devoção dos Portugueses.




Mas para além de Geraldo – o sem pavor, de Dom Dinis – o plantador de naus a haver, e da rainha Santa Isabel, também por Estremoz passaram outras ilustres figuras que ajudam a perceber a real importância desta cidade única de Portugal. Em 1367 morreu em Estremoz o Rei Dom Pedro I, muitos anos depois dos míticos e românticos amores com a sua eterna apaixonada Inês; Em 1385, foi Estremoz das poucas praças que sem vacilar apoiou a Causa Nacional durante a crise que levou ao trono o Mestre de Avis e que deu forma à Ínclita Geração, tendo sido dali que Dom Nuno Álvares Pereira, o Condestável Santo que fez nascer a Casa de Bragança e aquela que virá a ser a última das dinastias no trono de Portugal, saiu para as batalhas dos Atoleiros e de Aljubarrota, dando corpo a uma defesa total e intransigente do interesse Nacional. Da mesma maneira, alguns anos depois, é a Estremoz que o rei Dom Manuel I se dirige para entregar a Vasco da Gama a importante tarefa de descobrir o caminho marítimo para a Índia e de estabelecer o contacto com o Prestes João…

Não se percebendo bem de onde vêm tão ilustres pergaminhos, perdidos no sem-sentido que dá forma à história local, o certo é que Estremoz conjuga em si própria os encantos maiores do Sul de Portugal. Tal como o País vai sobrevivendo quase incólume às muitas desgraças que dão forma à sua história maior, também Estremoz reafirma a sua Portugalidade em torno de feitos e acontecimentos que se conjugam no plano das ideias ara dar forma ao desígnio maior da nação.

Visitar Estremoz, subindo ao amplo terraço que se encontra no topo da Torre de Menagem, é ser capaz de reviver os passos difíceis que por ali deram os nossos ancestrais avós, abarcando com a vista a amplitude infinita da paisagem alentejana. Deslumbrante e avassaladora, a brancura de Estremoz acompanha a beleza extraordinária do seu mármore que, depois de um processo alquímico associado à purificação maior das impurezas que o compõem, se transforma na pedra maior que dá forma ao que de melhor se construiu em Portugal. Está por todo o lado, nas asas, nas ruas e nos lambris dos passeios. Mostra-nos a altivez, o charme e a riqueza deste recanto mágico de Portugal.  









Dia 1 de Dezembro de 2014 e a Dependência de Portugal




O dia 1 de Dezembro marca uma data incontornável para Portugal. Em 1640, depois de avanços e recuos que foram determinantes para a definição do conjunto de práticas que deram forma à recuperação da independência nacional, os conjurados defenestraram (atiraram-no pela janela) Miguel de Vasconcelos e entregaram o trono de Portugal ao Duque de Bragança que foi aclamado como Dom João IV.

Durante muitos anos, uma prática reiterada que procurava reforçar a nossa identidade, o dia 1 de Dezembro foi feriado em Portugal. E foi feriado grande, devidamente celebrado um pouco por todo o País, precisamente porque marcava o mais importante de todos os acontecimentos políticos desde o dia 5 de Outubro de 1143 quando Dom Afonso Henriques fez nascer Portugal…

Mas depois de 1974, com governos atrás de governos e eleições atrás de eleições, os partidos políticos colocaram Portugal na bancarrota e, em situação de profunda dependência estrangeira e de subjugação à vontade de uma Europa onde a Alemanha tem a principal voz, resolveram abolir a comemoração.

E não o fizeram de forma linear… escondendo-se por detrás das desculpas que julgavam ser suficientes para lhes preservar a face, optaram por uma explicação fajuta, dizendo que a abolição do feriado seria essencial para a recuperação económica de Portugal! Dizem eles que sem este feriado, a produtividade de Portugal aumentará de forma exponencial.

Mas mentem. Mentem porque o peso económico da abolição deste feriado é de tal forma residual que que é possível que não é nenhum. E mentiram também porque a única consequência directa desta abolição é uma drástica, efectiva e muito substancial diminuição da consciência política nacional, associando a “pouca importância da restauração da independência” ao puro e simples esquecimento das circunstâncias que nessa altura viveu Portugal.

Agora, sem o feriado, a restauração da independência pura e simplesmente desapareceu das escolas, das salas de aulas e da memória nacional. Agora, tal como queriam os estrangeiros que controlam de forma efectiva os destinos e o devir do nosso País, está enfraquecida da Identidade Nacional.

Olhando criticamente à nossa volta, é árida a paisagem e vazios estão os campos onde ecoavam os gritos e as lutas dos nossos avós… E no seu lugar, para que cumpramos o destino que quem nos controla determinou, está o aquiescer perante interesses estrangeiros, num laivo de subserviência de um povo que sabe que já se perdeu a independência de Portugal.


Dia 1 de Dezembro de 2014. Triste. 

Mensagem de SAR o Senhor Dom Duarte no 1º de Dezembro de 2014




Mensagem de Sua Alteza Real o Senhor Dom Duarte, Duque de Bragança, Chefe da Casa Real de Portugal, por ocasião das Comemorações da Restauração da Independência, no dia 1 de Dezembro de 2014

Portugueses:

O 1º de Dezembro é a mais nacional de todas as nossas datas.

Sem ela, todos os outros feriados civis deixam de fazer sentido.
E por isso, começo por saudar a Iniciativa Popular para a reposição do feriado comemorativo do dia 1º de Dezembro!
Nós, monárquicos, nunca a deixaremos de celebrar como aquele dia em que renasceu Portugal!

Hoje, Portugal e os Portugueses vivem dias amargurados.

Vive a nossa Pátria dias difíceis porque não se comporta como País livre e independente, grande pelos seus avós, e grande pelos nossos filhos.
Não podemos hoje, a soldo de interesses económicos duvidosos, vender essa independência que tanto custou a tantas gerações de portugueses.

Vivem os Portugueses dias difíceis porque o desemprego assola as famílias e destrói capacidades e laços de vida, obrigando as mesmas famílias a terem o papel supletivo que o Estado social já não alcança.

Vivem os Portugueses dias difíceis porque são forçados a emigrar, sobretudo os mais jovens e sobretudo os mais qualificados; e por muita experiência que possam trazer de volta, fazem-nos agora falta.

Vivem os Portugueses dias difíceis, porque manifestam pouca confiança naquelas instituições que deveriam garantir a nossa democracia, como sejam a Justiça e a Assembleia da República.

É nestes momentos mais difíceis, que o povo português deve revelar as suas extraordinárias capacidades.

Assistimos a sinais muito recentes de que a Justiça finalmente está a funcionar, com plena independência entre os poderes.

A nossa justiça tem dado extraordinárias provas de independência apesar das péssimas condições com que os juízes contam para realizarem o seu trabalho.
Sem uma justiça rápida e eficiente não pode haver democracia.

Assistimos a que, nas eleições autárquicas, os portugueses manifestaram o desejo de ver independentes nos cargos municipais a serem escolhidos pessoalmente pelos eleitores.

Assistimos a sinais de que os cidadãos se movimentam para procurar alternativas políticas para as eleições legislativas, mais consonantes com tudo aquilo que a sociedade civil sabe fazer, e fazer bem.

Para todo este desejo de renovação que perpassa pelo nosso país, estou convicto que a Instituição Real seria muito importante, ao aproximar a população das suas instituições políticas.

Todas as democracias cujo Chefe de Estado é um Rei ou uma Rainha têm essa ligação muito mais forte do que os Países onde a chefia de Estado é assumida por um político, independentemente das notáveis qualidades pessoais que ele possa ter.

Num momento em que os portugueses sofrem as consequências gravíssimas de muitos anos de políticas economicamente irresponsáveis e moralmente desajustadas, precisamos de uma “revolução cultural”.
A ignorância e o relativismo moral estão na base da nossa crise actual.

Queremos que os produtos nacionais, na indústria, na agricultura e nos serviços, sejam cada vez mais conhecidos.

Queremos que os jovens encontrem alternativas adequadas às suas vocações.

Queremos que as famílias continuem a promover a educação dos filhos, apesar de entraves que o próprio Estado por vezes coloca.
Temos provas dadas na ciência, na tecnologia, na qualidade dos produtos nacionais, na ousadia dos nossos empresários, na dedicação dos nossos trabalhadores, nas competências dos nossos pescadores e agricultores, na eficácia das nossas Forças Armadas, nos feitos conseguidos pelos nossos desportistas.
Acreditamos que saberemos estar presentes num Mundo em evolução.


Aproveito para apelar aos nossos governantes, para que tenhamos uma intervenção em defesa das vítimas do fanatismo no Próximo Oriente.

Algumas organizações têm tido um papel muito importante na denúncia dos crimes cometidos contra as comunidades cristãs que há mais de mil anos vivem nessa região.

A Fundação de Ajuda à Igreja que Sofre é uma das mais eficazes no apoio efectivo às vítimas dessas perseguições.

A minha Família e eu temo-nos esforçado por contribuir para o progresso da nossa Pátria.

Neste ano que termina, visitámos em Família a Nação irmã de Timor-Leste, cujo Parlamento generosamente me concedeu a sua nacionalidade.

Visitámos S.E. o Presidente da República, General Taur Matan Ruak,  e o anterior Presidente da República,  Prémio Nobel Dr. José Ramos Horta e contactámos várias personalidades civis e religiosas.

O nosso filho Afonso foi nomeado pela Associação do Senado dos Liurais, presidido pelo Deputado Dr. Manuel Tilman, com o grau de Liurai Timorense.

Visitámos em caminho, a Tailândia, onde fomos recebidos pela Família Real e pela comunidade de origem portuguesa, descendentes dos militares que foram enviados para ajudar o Reino do Sião.
Visitámos também o Rei e a Família Real do Reino do Cambodja.

Visitei Angola, por ocasião do Congresso das Fundações da CPLP, iniciativa do maior interesse, tendo-me ainda reunido com Bispos da Conferência Episcopal Angolana.

Em Portugal visitámos oficialmente vários Concelhos a convite das suas Câmaras Municipais.
Em alguns casos, o motivo foi a celebração dos 500 anos do foral manuelino, noutros o apoio a boas iniciativas culturais, económicas e cívicas.

Estive presente em Braga, Sintra, Aveiro, Ovar, Porto, Guimarães, Massarelos, Estremoz, Viana do Castelo, Caminha, Aljustrel, Funchal, Torres Vedras, Lamego, Felgueiras, e Vieira do Minho. E daqui saúdo as suas populações, autarcas e outras pessoas que sempre tão generosamente me receberam.

O futuro de Portugal depende de mantermos vivas estas nossas raízes e de alcançarmos uma inteligente renovação das nossas instituições.
Só todos juntos, num esforço bem organizado, o poderemos conseguir.

Tenho afirmado que o pensamento republicano é de curto prazo; interessa-lhe resolver os assuntos a quatro anos, até às próximas eleições; é um pensamento muito provisório.

Hoje estamos aqui neste 1º de Dezembro porque respiramos o ar da História e esse ar mede-se por séculos e gerações e não por ciclos eleitorais.

E por isso, hoje e aqui, solenemente repito - na presença de minha Mulher Isabel, que tanto tem promovido as causas da família e da educação, e de meu Filho Afonso que este ano celebrou a sua maioridade - que a minha Família está preparada para assumir os compromissos que o nobre povo português nos quiser confiar.

Assim sucedeu noutras épocas da nossa gloriosa História como povo.

Assim possa vir a suceder, após estes tempos conturbados em que vivemos.

Viva Portugal!

Leia AQUI o comunicado oficial


quinta-feira

Sem Mãos em Vouzela e os Símbolos de Portugal




A honra e a glória andam quase sempre a par nos momentos mais marcantes da História de Portugal. Gente houve que, virando as costas ao sofrimento e à morte, ofereceram as mãos, os braços e a própria vida para salvar Portugal. Foi o que aconteceu com Duarte d’Almeida, o decepado de Toro, que recebeu o Paço de Vilharigues como prova do reconhecimento real pelos membros que deixou em terras de Castela.

por João Aníbal Henriques 

O heroísmo faz parte da História de Portugal. Num país que quando analisado de forma cuidadosa se percebe de imediato que não tem nenhuma razão pragmática que explique a sua independência e o facto de ter conseguido sobreviver a estes quase 9 séculos, assumem especial importância os actos heróicos de gente que foi capaz de superar os limites da existência e da racionalidade prática que dá forma à vida em sociedade. Foram eles quem tornou possível a existência de Portugal, concretizando autênticos milagres que são essenciais para se perceber este País extraordinário.

Em Vouzela sobrevivem hoje os resquícios únicos de um desses milagres excepcionais. O Paço de Vilharigues e a lendária estória do Decepado de Toro, o porta-estandarte do exército Português que, em 1476, ofereceu as mãos os braços para salvar a bandeira Nacional, são o presente de reconhecimento que a coroa entregou ao herói que deu forma a um dos mais marcantes (e desconhecidos) episódios da História de Portugal. Não existem provas da presença de Duarte d’Almeida neste lugar. Mas o que importa isso perante o valor tão grande deste símbolo excepcional?

No centro da Cidade, ali mesmo onde a solidez da pedra se impõe na arquitectura românica da Igreja Matriz de Vouzela, sente-se o peso de vários milhares de anos de História.

Vouzela sempre foi uma cidade importante. Embora seja dos Romanos que resta o maior número de vestígios, bem documentados através dos marcos miliares que nos permitem conhecer o emaranhado de muitas estradas que ligavam a cidade directamente a Roma, são pré-Históricas as origens deste espaço, carregando consigo os episódios rocambolescos que várias gerações foram acrescentando à História do lugar.

Apesar disso, o desígnio de Vouzela é uma lenda, perdida nos tempos e na tradição popular. Duarte d’Almeida, o decepado alferes-mor de Dom Afonso V, que está indelevelmente ligado a cada canto e recanto da localidade. Não se sabendo se existiu de facto, é ele o mítico senhor da região de Dão-Lafões que perdura nas memórias do povo e que transborda nas pedras duras que dão forma às casas, aos monumentos e à fácies da cidade.

A partir do alto da Senhora do Castelo, onde ainda se vislumbram os restos de um antigo castro que defendia as populações locais durante o conturbado período do neolítico, percebe-se bem a grandeza das terras de Vouzela. A Senhora do Castelo, ou da Esperança, conforme surge em alguns documentos medievais, dá o mote a um espaço com ocupação comprovada desde a pré-História e desde sempre de importância estratégica na salvaguarda e na segurança da cidade situada no sopé do monte. As duas interessantes sepulturas antropomórficas existentes no local, escavadas na rocha que também serviu para construir as muralhas que deram forma ao castro e que serviram pelo menos até à época medieval, mostram bem a ligação quase irracional que existe entre a vida e a morte neste local. Interagindo, o espaço dos vivos e o espaço dos mortos complementam-se, da mesma forma como se complementam os sonhos e os anseios da população actual com os vestígios, reais e imaginários – o que importa? – dos antigos que por lá viveram.

Reza o ditado popular que “triste é o povo que precisa dos seus inimigos para honrar os seus heróis”… e é isso precisamente que representa o Paço de Vilharigues, em Vouzela, tradicionalmente apontado como a casa do alferes-mor de Dom Afonso V, Duarte d’Almeida, conhecido como o “decepado” por ter perdido as mãos e os braços na batalha de Toro.

A armadura do alferes-mor Português, entendido pelos “inimigos” espanhóis como um herói corajoso e intrépido que foi capaz de se entregar pela causa que representava, está exposto em lugar de grande destaque na Capela de Santiago (Patrono de Espanha), na Catedral de Toledo, homenageando o herói nacional.

Responsável pelo pendão Nacional naquela batalha, Duarte d’Almeida foi perseguido pelo inimigo que lhe cortou a mão com a qual segurava o símbolo de Portugal. Continuando a lutar, o alferes-mor passou a bandeira para a outra mão que lhe foi cortada de seguida. E antes de cair, num espectáculo de sangue e sofrimento que serviu para preservar a honra de Portugal, ainda conseguiu segurar a bandeira com a boca para a entregar a um compatriota que a colocasse a salvo.

Em Espanha é homenageado como herói. Em Portugal ninguém sabe que ele foi nem que entregou a própria vida para salvar Portugal…

terça-feira

A Rainha Santa Isabel e o Milagre de Portugal



por João Aníbal Henriques

Em linha com o conjunto de circunstâncias inexplicáveis que dão forma aos mais importantes e impactantes episódios da História de Portugal, o conhecido “Milagre das Rosas”, protagonizado pela Rainha Santa Isabel, é um dos mais importantes exemplos da forma como o maravilhoso e o fantástico se cruzam amiúde, dando forma a entendimentos que ultrapassam gerações. São eles que, sem sentido algum, dão sentido ao sempre intrincado enredo de condicionalismos que compõe a existência humana…

Nascida em 1271 e filha do Rei D. Pedro III de Aragão e da Rainha Constança da Sicília, Isabel de Aragão foi rainha de Portugal por casamento efectuado por procuração com o Rei Dom Dinis em 1282.





A criança, trazida para Portugal em virtude de um casamento que resultou dos interesses políticos daquela época, recebeu mercês diversas e o senhoria de uma imensidade de cidades e vilas que serviram de dote inicial.

Com um marido que os documentos coevos apontam como “pouco devotado” à sua jovem esposa e dedicado em demasia aos encantos femininos de Portugal, a Rainha Santa Isabel ficou conhecida pela forma benigna que utilizava para tratar o seu marido e os muitos filhos ilegítimos dele. Em igualdade com os seus próprios filhos, a todos tratou com o mesmo desvelo, garantindo-lhes alimentação e educação e trazendo-os para o paço onde os mesmos cresceram.

Reza a lenda que, num dia em que o próprio rei a informou de que iria visitar umas amigas num convento situado numa zona próxima de Lisboa, foi ela própria quem lhe respondeu “Senhor… ide vê-las” tendo dado origem ao topónimo Odivelas.




Profundamente devota e dedicada às causas sociais, são também conhecidos vários arrufos com seu marido que, preocupado com o rombo nos cofres reais, via com maus olhos o desvelo com que ela tratava os mais pobres e necessitados, a quem oferecia pão e dinheiro a título de esmolas que lhe granjearam fama de santa ainda em vida. Foi de um desses episódios, aliás, que nasceu a sua lenda mais conhecida – a Lenda das Rosas – que romanticamente se espalhou em Portugal e que acabou por influir largamente na definição do espectro da espiritualidade nacional.

Reza a lenda que, numa manhã fria de Janeiro, a rainha saia do paço carregando pão para os pobres quando foi interpelada pelo rei que pretendeu saber o que é que ela transportava no regaço. Mentindo-lhe, a rainha disse-lhe que eram rosas que iria utilizar para alegrar os altares das igrejas da cidade. Estranhando a existência de rosas em pleno Inverno e principalmente naquela gélida manhã de Janeiro, Dom Dinis terá solicitado à rainha que lhe mostrasse o que transportava, e ela, largando das mãos o pão que escondia, deixou cair no chão um conjunto maravilhoso e muito aromáticos das mais bonitas rosas que se tinham visto por aquelas paragens… “São rosas, senhor!” foi a frase que ficou a marcar os arquétipos da crença nacional, corporizando um milagre de metamorfose alquímica que fui considerado como a prova máxima da sua santidade e sustento principal da sua beatificação (1516) e posterior canonização (1742).

Tendo tido uma profusa intervenção política em Portugal e em Castela, não só durante o período em que foi rainha mas também depois de viúva, interveio muitas vezes como mediadora em conflitos variados evitando a guerra e alcançando a paz entre os oponentes. O melhor exemplo aconteceu ainda durante a vida de Dom Dinis, quando este, dando preferência a um filho bastardo a quem pretendia deixar em herança o próprio Reino de Portugal, entrou em conflito com o filho legítimo, futuro Dom Afonso IV, tendo sido a rainha quem garantiu o alcançar da paz através de um processo de mediação que evitou aquela que possivelmente teria sido a mais sangrenta das guerras civis de Portugal.




Já muito doente, com a peste que matou centenas de milhares de pessoas em Portugal, deslocou-se a Estremoz em 1336 pra uma vez mais intervir num conflito que opunha o seu filho ao Rei de Castela. Faleceu no Paço Real daquela vila Alentejana, deixando escrita a sua vontade de que o seu corpo fosse sepultado no Convento de Santa Clara-a-Velha, em Coimbra, onde havia professado.

Tendo morrido em Julho, numa época de calor tórrido semelhante aquele que ainda hoje fustiga aquelas terras, foi preparado um caixão de chumbo para transportar o corpo na longa viagem que teriam de fazer até à Cidade do Mondego. Tentando evitar os cheiros resultantes da decomposição do corpo ao longo daqueles dias, o féretro foi reforçado e envolvido em vários tipos de panejamento e em perfumes de várias espécies.

Mesmo assim, mercê do calor que afectou o caixão durante o trajecto, este ter-se-á deteriorado com os gases libertados pelo cadáver da rainha e aberto algumas rachas por onde começou a sair um líquido espesso que muito preocupou muitos daqueles que acompanhavam o cortejo. Mas, para surpresa de todos, verificou-se que esse líquido deitava um cheiro maravilhoso a flores e não o mau-cheiro pelo qual todos esperavam…

Por ocasião do processo de canonização, já no Século XVIII, quando o caixão foi transportado de Santa Clara-a-Velha para Santa Clara-a-Nova depois de as águas do Mondego terem inundado por completo o antigo convento, o caixão voltou a ser aberto e perante a estupefacção de todos, verificou-se que o corpo se mantinha incorrupto e que o cheiro continuava a ser o mesmo aroma a flores que haviam descrito os participantes no primeiro cortejo praticamente quatro séculos antes.

Na actualidade, com muitos devotos espalhados por Portugal e por Espanha, a Rainha Santa Isabel é venerada a 4 de Julho, dia da sua morte, sendo a sua mão exposta pontualmente para que possa ser vista por milhares de interessados.

Rainha, mulher e santa, Isabel de Aragão é uma das figuras incontornáveis da História de Portugal. Na sua vertente mística, associada a processos complexos de uma originalidade sem igual, extravasou largamente o seu tempo e espraiou a sua influência ao longo de muitas gerações que foram cruciais no desenvolvimento na afirmação e na sobrevivência de Portugal.

A sua veia alquímica, suportada pelo controle efectivo da organização da matéria, visível no Milagre das Rosas e na incorruptibilidade do seu corpo venal, representa o êxtase máximo que se pode associar à magia deste País tão especial…

Vale a pena conhecer, compreender e interiorizar. Porque a Rainha Santa Isabel ajuda a perceber Portugal. 



quarta-feira

As Cheias em Cascais - 19 de Novembro de 1983




Cumprem-se hoje 31 anos desde que Cascais amanheceu coberta de água. Naquela madrugada, numa noite de Sexta-feira para Sábado, preparava-se mais uma manhã de mercado saloio no centro da Vila. Por todo o lado, num cenário dantesco no qual o caos imperava, fluíam ao sabor das águas os sacos de batatas, as caixas de legumes e mesmo os carros e carrinhas que os transportavam. Naquela manhã, mesmo perante o pânico que estava instalado, ouviram-se desde cedo o som dos motores dos barcos que aproveitaram a situação para roubar lojas e casas. Ao mesmo tempo, na actual Praça Francisco Sá Carneiro, um casal de idosos morreu enquanto tentava desesperadamente serrar com uma faca de cozinha as grades que poucos dias antes havia mandado colocar nas suas janelas...  31 anos depois, aqueles que tiveram a infelicidade de acordar rodeados de águas, sem electricidade, telefone ou qualquer outro tipo de comunicação, ainda sentem no ar o cheiro putrefacto que emanava daquelas águas lamacentas. Nalguns recantos da vila, dentro de casas e em muros que ninguém imaginaria que algum dia estiveram submersos, ainda hoje se podem ver os restos das lamas que o dia 19 de Novembro de 1983 trouxe para Cascais. 













Fotos Recolhidas em Real Villa de Cascaes no Facebook

segunda-feira

O Convento dos Capuchos em Sintra




por João Aníbal Henriques

São raros os espaços assim que, extraordinários e impactantes, não estão associados à monumentalidade das suas construções mas sim à singeleza levada ao extremo. É o que acontece no Convento dos Capuchos, em Sintra, onde a força da natureza de cruza com a vontade do homem para recriar um espaço que apela ao sonho e à vida, ao mesmo tempo que acorre aos desígnios que a carne impõe ao homem…

Embrenhado nas penhas antigas que dão forma à Serra da Lua, o Convento dos Capuchos, também conhecido como Convento da Cortiça, recria-se a partir da solicitação da pobreza extrema e do despojamento total que caracterizava os seus mais antigos habitantes.




Construído em 1560 por Dom Álvaro de Castro, em cumprimento de um voto formulado pelo seu pai D. João de Castro, Vice-Rei da Índia, que por ali adormeceu durante uma caçada e que terá sonhado com a criação de um pedaço de céu neste recanto inóspito da serra, o Convento dos Capuchos associa o fulgor da natureza, com as suas pedras e penhascos envolvidos em vegetação que romanticamente o envolve, com os mais profundos sonhos e anseios da humanidade.

Para lá entrar, passando um portal de sombra que nos verga perante a cruz, é necessário abandonar as paixões do mundo e das coisas, de forma a tornar possível abraçar por completo os desígnios mais profundos da divindade. Lá estão, aliás, o portal com a caveira e as duas tíbias cruzadas que, encimando a porta que sai do terreiro do sino para entrar no espaço conventual, simboliza a morte em vida e o triunfo desta última sobre as funestas sombras da morte…




E lá dentro, no estreito e obscuro corredor que dá acesso à luz interna, ficam as memórias daqueles que se enterraram vivos, entregando a Deus o seu insignificante corpo em busca da gloriosa apoteose da vida verdadeira, ou seja, daquela que é imortal e que surge livre das peias constrangedoras da carne.

Pobre, sombrio e frio, ao ponto de causar estranheza a possibilidade de se viver assim, o convento obriga-nos constantemente a baixar a cabeça. Fazemo-lo para entrar nas celas conventuais, na sala do capítulo, na sala de jantar ou nas cozinhas, num acto de reverência perante Deus e num ritual de humildade em linha com o ideário Franciscano que dá forma à Ordem que por ali prevalece.

Por todo o lado, cumprindo a sua obrigação de gritar bem alto que o crucifixo é uma realidade passageira, obviamente necessária para que a carne faça sentido, mas necessariamente transitória no percurso maior em direcção a Deus, lá está a rosa-cruz, espécie de roda em eterno movimento que grita bem alto a Boa Nova e a ressurreição de Cristo Nosso Senhor.




Mas são muitos e variados os motivos de interesse deste espaço excepcional. Desprovida das expressões mais vulgares da arte e da ostensiva presença de um espólio enriquecido pelos muitos séculos de boas-práticas que aquelas paredes já viram, a cerca é um autêntico cadinho de maravilhas naturais, numa simbiose perfeita entre a força da natureza e a vontade de Deus. Ninguém fica indiferente à decoração em cortiça, que enche por completo cada canto e recanto daquele espaço conventual, nem tão pouco à labiríntica disposição dos seus longos corredores, dispostos com naturalidade em torno da formulação das penhas ancestrais que a natureza por lá deixou.

Neste convento, perdido num tempo que se constrói a partir da inexistência do tempo, viveu durante muitas décadas o célebre e mítico Frei Honório que, de acordo com a lenda, se penitenciou durante trinta anos numa gruta inóspita existente na cerca, por ter cedido à tentação perante uma mulher que lhe havia sido enviada pelo maligno para o deter. A pé e água, lá terá sobrevivido até aos cem anos, tendo como companhia exclusivamente a paisagem magnífica da Várzea de Sintra e o frio cortante que constantemente bate o local, carregando as penas de quem por lá estiver. Mas era isso que procurava Frei Honório. A libertação do corpo em defesa de uma Alma pura e liberta das teias e tentações que a carne faz prevalecer.




É de deslumbramento total e permanente uma visita ao convento. Porque ali encontramos os arquétipos ancestrais que dão forma à nossa forma de ser e de pensar, ansiando na Terra pela descoberta do caminho em direcção ao céu. Filipe II de Espanha, o todo-poderoso rei que uniu Madrid e Lisboa num mesmo trono controlando um Mundo inteiro sob o seu ceptro, escreveu às suas filhas depois de visitar o convento dizendo que existiam duas maravilhas no seu reino: o Escorial, em Espanha, e o Convento dos Capuchos, em Sintra…

Pouco se pode dizer sobre esta preciosidade do património Português, até porque a singeleza que o caracteriza apela ao deslumbramento e à espiritualidade que é sempre superior às palavras e ao talento necessário para as transformar na montra que é necessário fazer. Mas é, certamente, um daqueles locais que vale a pena visitar nem que seja uma vez na vida, até porque quem lá entra, desde que o faça com a capacidade crítica de entendimento do espaço e de todos aqueles que por lá viveram, recuperará certamente uma vida nova em linha com a ideia de um paraíso terreal que todos gostaríamos de conhecer prevalecer.
















O Estado da Anestesia em Portugal



por João Aníbal Henriques

Rebentou na última semana um dos maiores escândalos de sempre em Portugal. Com mais de uma dezena de envolvidos escolhidos de entre alguns dos mais altos funcionários do Estado, este escândalo mostra aos Portugueses um novo nível de corrupção, mais em linha com um qualquer romance de cordel do que com a triste história que actualmente caracteriza este país em que vivemos.

Infelizmente, depois do enredo que envolveu o mais escandaloso início de um ano lectivo em Portugal; da incrível estória protagonizada pelo Ministério da Justiça e dos seus inventados sabotadores encomendados que paralisaram os tribunais e a própria justiça durante muitas semanas; do extraordinário caso de falência do Grupo Espírito-Santo, com as incompreensíveis intervenções do Banco de Portugal, do Governo e do Presidente da República; da odorífera facada nas costas dada no líder do PS pelo seu correligionário socialista que ainda é presidente da Câmara Municipal de Lisboa; da cisão absurda e tremenda na já de si liderança bicéfala do Bloco de Esquerda; da maravilhosa estória da decisão irrevogável do Presidente do CDS; do abrasileirado escândalo da destruição da Portugal Telecom, acompanhado pelos prémios chorudos que foram dados aos que cavaram a sepultura daquela empresa estratégica para Portugal; de um Presidente da República que tibuteantemente mostrou não estar interessado em intervir directamente nos destinos do nosso Estado e de um Governo que assobia alegremente perante o descalabro geral que caracteriza Portugal, pouco ou nada resta para dizer, pensar ou discutir neste nosso desgraçado país…

A dose de irrealismo, que dantes se comparava ao caos que se instalou durante a primeira república mas que actualmente já o ultrapassou largamente, transformou Portugal numa espécie de grande arena de circo na qual tudo pode acontecer.

Já ninguém se espanta, nem ousa sequer criticar ou contrariar as desvairadas decisões de quem detém o poder. Para quê?...

E, se a nível estatal as coisas atingiram um descrédito que é transversal a todos os partidos e a todos os sectores de actividade, a nível local a situação não é diferente. Presidentes de câmaras legitimados pelos votos das eleições de 2013, põem e dispõem da coisa pública como se ela fizesse parte do seu pecúlio pessoal. Os balcões das empresas municipais, repletos de faces airosas oriundas das juventudes dos partidos onde trabalharam gratuitamente em troca de um emprego, são uma espécie de pastos onde a maralha divide o pouco que Portugal ainda consegue produzir.

E quem pode pensar em criticar esta gente? Ninguém! Pois se é tudo assim… se todos fazem o mesmo… se ninguém assume as consequências dos seus actos e se à boca cheia se regurgita a máxima de que quem não come é parvo!...

O certo, para alguém que ainda gosta de Portugal e que acredita que ainda é possível salvar a herança que recebemos dos nossos avós ao longo de mais de oito séculos, é que já pouco ou nada há a fazer. Pelo menos de dentro desta máquina de devastação onde os equilíbrios são precários e as dependências são transversais a toda a gente.

Entretanto, enquanto lá fora as estações vão passando, cruzando eleições futuras com os muitos interesses que todos sabem que dão forma ao nosso Estado, continuam um espectáculo deprimente que todos somos obrigados a ver e a financiar.

Os Portugueses estão anestesiados, incapazes até de reagir ao que no estão a fazer. E ainda bem que assim é! Porque senão seria insuportável a dor perante o desrespeito atroz perpetrado por esta gente.


Não vale a pena! The show must go on! Já não há nada que se possa fazer… 

A Casa dos Expostos de Cascais



por João Aníbal Henriques

Abordar a História de Cascais, numa primeira vista, pressupõe a menção a um infindável rol de nomes, mais ou menos importantes, ou de personalidades que viveram ou desempenharam as suas funções profissionais neste concelho. Para além destes, em alguns casos, fala-se também de conhecidas confrarias e corporações, que deixaram marcas profundas e de  grande relevo no desenvolvimento histórico da localidade.

No final do século XVIII, quando Portugal assumiu por fim a necessidade de congregar esforços no sentido de precaver a nação contra os infortúnios alheios, foi criada em Lisboa, de acordo com as ordens de Pina Manique  e as directivas da Rainha D. Maria, uma instituição de caridade denominada «Casa dos Expostos». Cascais, como peça fundamental do devir histórico da época, não esteve alheio a esta questão, decorrendo pouco tempo até que em aqui se instalasse um organismo semelhante.




De acordo com as informações de Carlos Andrade Teixeira, ilustre Cascalense, a Casa dos Expostos de Cascais teria sido criada no ano de 1822, recebendo no dia 27 de Julho uma primeira criança do sexo masculino, que foi posteriormente baptizada com o nome de Prudêncio e que viria a falecer um ano mais tarde.

A casa onde funcionava a "Roda", situava-se numa pequena edificação saloia na Travessa da Nazaré, e que ainda hoje existe embora muito alterada na sua formulação urbanística original, e estava munida de uma roda de madeira, que girava em torno de um eixo central, de modo a que as crianças enjeitadas pudessem ser colocadas no seu interior, sem qualquer espécie de identificação da pessoa responsável pelo acto. Depois, as crianças passavam rapidamente para as mãos de uma ama que as recolhia e que, a expensas do estado, promovia a sua educação durante os primeiros anos de vida.

As amas de Cascais, também elas figuras humildes e dedicadas ao ofício pelas necessidades financeiras, tinham obrigatoriamente de ser moças casadas e minimamente preparadas para o desempenho das suas funções, tal como se pode ler no despacho geral do intendente: «[...] moça casada, fecunda, bem constituída e aceada, a qual se conservará enquanto for possível;».

Se do ponto de vista psicológico o abandono de crianças nos últimos anos do século XVIII parece ser um aspecto ímpio da vivência portuguesa, por outro a instituição da Casa dos Expostos ou da Roda, é também ela evidenciadora de um sentido novo que emanava dos órgãos de estado portugueses. Estas crianças, que ganhavam assim uma oportunidade para se manterem vivas, embora em condições de extrema pobreza, estavam destinadas quase sempre a uma morte a prazo. Os cuidados de saúde daquela época, bem como a motivação que levava à candidatura das amas àquele cargo, determinava quase sempre a morte prematura do abandonado, que se sujeitava, sem que qualquer culpa lhe fosse formulada, a todas as vicissitudes que ordenavam a vida da Rodeira. Este problema, indiciador de uma certa sensibilidade por parte das entidades públicas Portuguesas, é também ele evidenciador de outras questões: Como é óbvio, a preocupação fica certamente a dever-se ao elevado número de crianças abandonadas, evidenciando um clima de instabilidade moral que grassava no País nessa época...




Numa perspectiva patrimonial, e porque a Casa da Roda de Cascais ainda se mantém no seu sítio, importante seria a recuperação integral daquele espaço. A manutenção da antiga Roda no centro da vila, indiciadora de todos os problemas económico-sociais anteriormente mencionados, é um excelente exemplo crítico de uma sociedade que não se encontra ainda muito longe de nós e que poderia contribuir para o reforço da atractividade da Vila de Cascais.

As características arquitectónicas do imóvel, perfeitamente enquadráveis na tipologia corrente no núcleo histórico da vila de Cascais, permitiram a subsistência de uma componente da memória colectiva que muitas vezes é delegada para segundo plano. A compreensão da história do município Cascalense, bem como da forma como se constituíram, programaram e delimitaram as funcionalidades urbanísticas deste espaço, ficaram a dever-se a componentes sociais e psicológicas que são levadas em conta na sua constituição e que poderiam ajudar-nos a perceber melhor a forma como funcionava a estrutura social desta nossa terra.

O centro histórico de Cascais, com as ruelas envolvidas em sombras escuras e húmidas, é o resultado da interacção da geografia, do urbanismo pré-existente, mas também dos condicionalismos sociais que deram forma à comunidade Cascalense. 

Desconhecida por quase todos, a Casa dos Expostos de Cascais é um exemplo da potencialidade patrimonial deste concelho, desaproveitada e tristemente votada a uma anomia que tanta insatisfação latente vai consolidando em torno de um identidade há muito deturpada pelos interesses específicos e particulares daqueles que nos governam.

Uma tristeza!