segunda-feira

Em Memória do Cruzeiro e do Monte Estoril





Tragicamente, depois de quase sessenta anos de uma História repleta de muitos acidentes, o edifício histórico do Centro Comercial Cruzeiro, no Monte Estoril (Concelho de Cascais) vai conhecer o seu futuro.

O projecto inicial, da autoria de Manuel António da Cruz e de João da Cruz, ditou o seu original nome, que foi consolidado pelo facto de se situar num local onde se cruzavam duas das antigas linhas de águas naturais do Monte Estoril.

Com a primeira pedra lançada em 1947, em pleno período de crise provocado pelo pós Segunda Guerra Mundial, a construção do edifício sofreu vários reveses, tendo sido Fausto de Figueiredo, o fundador do moderno Estoril, uma das personalidades que mais o atacou temendo que o mesmo pudesse vir a condicionar o sucesso do seu próprio projecto urbanístico.

No entanto, depois da inauguração, em 1951, a Revista Portuguesa de Turismo consagra-lhe um enorme e muito elogioso artigo, no qual o considera um dos mais arrojados e interessantes projectos do Portugal moderno. No dizer da revista, foi “um dos melhores da Europa” de então…

Foi, de facto, o primeiro centro comercial Português e apesar do estado de abandono profundo em que ficou desde finais da década de setenta do Século XX, manteve sempre a sua importância na definição das memórias e da Identidade Cultural daquela localidade.

Recentemente, depois de se ter entaipado o edifício, pretensamente para evitar acidentes que resultassem da queda de pedaços de cantaria que se soltassem dos rebordos superiores do imóvel, surgiu finalmente o novo projecto para o edifício que se pretende que venha a ocupar este lugar.

Mas, contrariando a vontade dos Monte Estorilenses; subvertendo a importância e o valor do Cruzeiro na consolidação da Identidade Local; esquecendo que a própria envolvência do Monte Estoril é uma preciosidade que importa valorizar; e sobretudo que existe uma História repleta de muitas estórias que transformam este lugar num dos mais significantes para a História de Cascais; o projecto em curso (que as imagens que juntamos traduzem muito bem) opta por construir um edifício de traça pós-moderna, sem qualquer espécie de ligação estética ao velhinho Cruzeiro, numa atitude de total desrespeito pela memória do Monte Estoril.

Parece que é esta a sina, novamente, do património, das memórias e da Identidade de Cascais!






Capotira - Romance de Roberto C.P. Júnior





As marcas perenes do destino são as principais linhas que dão forma ao mais recente romance da autoria de Roberto C.P. Júnior.

Intitulado “Capotira” o novo livro que agora é apresentado, situa-se no alvorecer do Século XIX e traduz de forma exímia a relação entre a fidalguia Portuguesa chegada ao Brasil num momento difícil da História da nação, e os índios Brasileiros. A troca de culturas, assente em saberes ancestrais que o próprio destino se encarrega de fomentar, dá origem a uma sociedade diferente, única e irrepetível, na qual o mundo das evidências e das reflexões assume papel principal.

Como diz Caroline Derschner, que prefaciou esta obra, “na época que precedeu a sucessiva predominância do homem dito civilizado sobre a nação indígena brasileira, aqui ricamente detalhada, as raízes de alguns dos nossos costumes e crenças mais remotos vêm à tona e, pelo olhar acurado do escritor e pesquisador Roberto C.P. Júnior, nos deixam uma pergunta no ar: quais fenómenos são capazes de reger a vida dos homens, orquestrando as trilhas pelas quais todos caminhamos, não importando de maneira nenhuma a época, etnia raça ou grupo social em que nos encontramos?”…

O autor, Roberto C.P. Júnior é investigador e escritor com uma vasta obra publicada. É também académico da ALA – Academia de Letras e Artes.

Uma obra a não perder!

quinta-feira

O "Caos Urbano" por António de Sousa Lara





Com o País envolto numa crise profunda e com consequências imprevisíveis, assume especial importância a publicação do livro “Caos Urbano”, com coordenação do Presidente da ALA, Professor Doutor António de Sousa Lara, cuja apresentação decorreu no IESM – Instituto e Estudos Superiores Militares.

Dando conta dos factores de turbulência e instabilidade que surgem associados aos cenários de crise, esta obra analisa de forma exaustiva diversos casos que têm afectado as sociedades contemporâneas, apontando pistas que permitem interpretar, compreender e lidar com a situação difícil que Portugal atravessa.

Esta obra colectiva que contou com o prefácio do General Pinto Ramalho, teve ainda a participação de Carlos Carreira, Heitor Romana, José Antunes Fernandes, Pedro Clemente, Pedro Ferreira da Silva, Rogério Jóia e Teresa Almeida e Silva.

Mais do que um estudo, este livro traz-nos as pistas que se afiguram essenciais para responder aos novos desafios que o futuro se prepara para nos trazer.





Memórias de Cascais na Época Medieval




por João Aníbal Henriques

Sendo certo que é geralmente difícil conhecer em profundidade as raízes medievais de uma terra ou lugar, o certo é que, naquelas em que a importância estratégica se apresenta, as menções diversas em documentação de vários géneros e a sua ligação aos mais importantes episódios da História Nacional, acabam por nos oferecer caminhos e pistas que facilitam esse reconhecimento e a compreensão dessa realidade. É esse o caso da Vila e do Concelho de Cascais.

Neste caso específico, existem variadíssimas razões para que tal aconteça. Em primeiro lugar porque, como acontece na generalidade dos casos análogos, o Castelo Medieval de Cascais teve certamente a sua origem em estruturas defensivas anteriores, muito possivelmente durante o domínio Árabe da Península Ibérica (711-1147) facto que lhe conferiu uma História longa no tempo e um assentamento humano que, prolongando-se ao longo de muitas gerações, deixa evidentemente vestígios das suas actividades. Depois, e tal como nos comprova a arqueologia, porque a generalidade destes espaços, e Cascais não foi excepção, viram-se ocupados por construções de outras origens que, principalmente em épocas de paz prolongada, iam subvertendo a sua original componente defensiva e militar, num uso de índole habitacional e doméstico. Ou seja. Reconfigurando-se o seu miolo, as estruturas defensivas originais perpectuaram-se no seio da estrutura urbana posterior e, dessa maneira, permitiram a conservação de muitos dos seus vestígios e de muitas postas sobre a forma como se organizavam anteriormente.

Cascais, de forma especial, pela proximidade ao mar e pela sua posição estratégica na guarda de Lisboa, necessitou de permanentes e profundas intervenções de manutenção e adaptação, pelo que o devir histórico das suas muralhas de foi permanentemente readaptando ao longo do tempo.

Por todas estas razões, o que muitas vezes nos resta em termos informativos relativamente a estes espaços, é uma amálgama de vestígios diversificados que não nos permite esmiuçar de forma profunda e rigorosa as origens reais e o momento do seu surgimento.

Por último, importa sublinhar que os testemunhos que subsistem dessas épocas são normalmente subvertidos por exageros, falta de isenção e, sobretudo, pela necessidade de adequação a interesses específicos que conjunturalmente afectavam a terra, as entidades oficiais, ou mesmo o próprio autor dessas palavras. A documentação, enformando desse desígnio, deverá ser, por isso, perscrutada com especial atenção, retirando delas as pistas que permitirão reinterpretar as palavras que contêm à luz do que hoje conhecemos sobre a realidade dessa época.

Em termos pictográficos, profusamente utilizados para tentar compreender a forma como Cascais existiu e evoluiu ao longo dos tempos, verifica-se ser muito difícil, devido a imprecisões diversas que a documentação apresenta, discernir aí a visão concreta sobre a realidade local. As plantas e imagens, desenhadas à mão por gente que por vezes tinha pouco apetência para as artes plásticas, condicionada pelo facto de não serem raros os casos de calques efectuados sobre outros decalques já de si portadores de diversas deficiências, tornam-se instrumento incapazes de nos apontar os dados pelos quais tanto ansiamos.

Em resumo, e salvo a possibilidade de uma eventual descoberta fortuita de nova documentação esquecida num qualquer arquivo, é praticamente impossível definir com total exactidão os contornos do que foi Cascais durante a época Medieval.

Ponto de honra é, no entanto, a certeza absoluta de que Cascais foi terra de importância extraordinária na definição do Portugal moderno. A comprová-lo, para além da relevância estratégica da sua posição de controlo da entrada na barra do Tejo e, por isso, enquanto guarda avançada de Lisboa, está a sua posse, durante este período por gente da primeira linha de fidalgos essenciais para a Casa Real. Gomes Lourenço de Avelar e, mais tarde, Henrique Manuel de Vilhena, foram ambos figuras excelsas de um Portugal ainda em afirmação no contexto de uma Europa envolvida em precariedade e, por tudo isso, são provas cabais do interesse que a Coroa dedicava a esta pequena Vila plantada junto ao mar.

A tudo isso não será estranho, até porque daí derivaram os muitos sucessos que nasceram da crise de 1383-1385, o facto de as Guerras com Castela terem aumentado a importância da Vila, tornando-a ponto fulcral na estratégica defensiva do Reino de Portugal.

As guarnições de soldados que acorreram à Vila, principalmente depois de Dom Pedro I lhe ter concedido a independência relativamente a Sintra, povoaram de forma permanente a outrora insignificante vilória, suscitando interesses complementares, ao nível do comércio e dos serviços, que condicionaram de sobremaneira a História recente de Cascais.

Cascais é, desta maneira, peça incontornável na medievalidade Portuguesa, assumindo papel de grande relevo na reformulação da pirâmide político-social Nacional. Nessa altura, como hoje, conhecer as origens da Identidade Cascalense, é perceber como é que a gestão das potencialidades deste tipo de territórios pode ser essencial na definição daquilo que somos, do que sentimos, do que fazemos e do que pensamos.