quinta-feira

O Medo em Portugal




por: João Aníbal Henriques



Enfrentando uma vez mais o aparelho partidário, Manuel Alegre vem hoje a público falar do medo que tolhe o dia-a-dia dos portugueses e, principalmente, da forma como o Estado socialista tem vindo a proceder de uma maneira que promove a falta de liberdade nas suas mais variadas expressões.


O medo de que fala, mais do que directamente relacionável com um determinado problema e/ou situação, prende-se com algo de não concretizável, ou seja, a situações que, sempre pela calada e de forma não assumida, acabam por criar na comunidade um sentimento de permanente apreensão que inibe determinados tipos de comportamentos.


A gravidade da situação, que todos sabemos ter implicações directas no quotidiano dos cidadãos, no seu emprego, comunidade, vida social ou mesmo na família, é maior se pensarmos que ela tolhe (ainda mais) a já de si calcinada possibilidade de todos terem (e poderem exercer) o seu direito individual à diferença e à opinião para expressarem o que pensam e o que sentem relativamente ao Estado e ao Governo. E esta gravidade, que na prática pouco ou nada se sente em Portugal, País habituado à embriaguez de um fim-de-semana passado no centro comercial e à fila de trânsito em direcção à Quarteira ou à Costa da Caparica, é ainda mais problemática se pensarmos nas implicações que tem na prática democrática e na capacidade de representação que o Estado deve ter relativamente aos cidadãos.


Sabemos, de antemão, que a liberdade de escolha, génese da democracia, se centra na possibilidade de cada um poder exprimir a sua opinião livremente, em grande respeito pela opinião alheia, e em contribuição positiva para o bem comum. Também sabemos que em Portugal, infelizmente, essa mesma capacidade esta coarctada pelo facto de o sistema político estar controlado pelos partidos políticos que, exercendo todas as premissas que o poder lhes confere, lutam ferozmente para que a dita sociedade civil não encontre espaço de trabalho para a sua afirmação comunitária.


Por isso, ao refrear ainda mais a liberdade inerente à expressão, o medo mencionado hoje por Manuel Alegre é mais um passo no sentido da não afirmação individual e, com isso, um contributo efectivo para travar a possibilidade de criação de uma verdadeira democracia representativa em Portugal.


Depois das recentes eleições para a Câmara Municipal de Lisboa, e da desastrosa prestação dos partidos, ficou bem evidente que a democracia (tal como foi concebida pelos obscurecidos mentores de Abril) está morta. Também se viu que, mesmo preso nas teias emaranhadas dos partidos de onde saiu, o designado “fenómeno independente” teve repercussões efectivas, evidentes e drásticas nos resultados…


Parece, por isso, que o medo criado pelo aparelho socialista, que Manuel Alegre tão bem identifica no seu artigo de ontem, mais não é de que uma resposta ao medo (esse sim real e com causa definível) que o partidarizado sistema político português sente por ver aproximar-se o momento em que, afirmando-se de forma efectiva, os portugueses vão tomar conta de Portugal.


Sem medo, sem temor perante as consequências e com a coragem de quem sabe que a próxima década e a próxima geração, serão decisivas para o devir histórico de Portugal, a sociedade civil, independente, consciente e livre, vai assumir o seu destino, e criará uma nova democracia no nosso País.


Nessa altura, independentemente de ideologias, posicionamentos práticos, projectos pessoais, ambições corporativas, poder, credo ou cor, Portugal vai mostrar que é possível não ter medo.